22.6.18

The Love Witch

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2016
Comédia, Terror
Direção: Anna Biller
Roteiro: Anna Biller




 


Elaine (Samantha Robinson) decide recomeçar a vida após a morte de seu marido. Utilizando seus novos conhecimentos de bruxaria, ela procura um novo amor a qualquer custo.

Eu andava com saudades desse blogzinho e fico feliz em retornar para falar de um filme maravilhoso dirigido, produzido, escrito, editado, cenografado, entre outros, por uma mulher!

Começo dizendo que eu totalmente não estava preparada para esse hino. Eu me sentei completamente despretensiosa para ver um filme escolhido quase no aleatório. Primeira coisa que aparece na tela é o rosto da Samantha Robinson, com aquela maquiagem e cabelos maravilhosos. Eu até pausei e me acomodei melhor no sofá! E, para minha alegria, essa cena já assinala o tom do filme todo.

Não é como se o filme fosse um pastiche das produções das décadas de 60 e 70 (e mesmo bem anteriores), tentando se passar por um produto de outra época. Anna Biller se apropria do visual, se apropria da linguagem, os atores reproduzem os trejeitos afetados, mas o texto é completamente outro. Aqui a história é contada do ponto de vista feminino para o público feminino.

Aliás, vamos aproveitar a deixa e sair da conversa técnica, que eu nem domino muito, e partir para o que realmente me interessa.

A cineasta traz estereótipos exagerados (como tudo no filme é) para evidenciar e criticar comportamentos que já deveriam estar extintos no mundo. Elisa é tudo aquilo que a (nossa) sociedade quer que a mulher seja e passa a vida aprendendo que deve ser. Claro, em nome do argumento e da comédia, Anna Biller estica esse conceito até seu máximo. Elisa é a versão hardcore da mulher bela, recatada e do lar. E ela não tem a menor noção de quão nociva é por causa disso, tanto para si, quanto para as outras mulheres (homens, o que tenho a ver). A amiga Trish (Laura Waddell) faz o contraponto óbvio e exagerado, mas o tratamento que Biller dá a ela ressalta que essa pessoa (ainda) não tem seu lugar na sociedade. Ela é coadjuvante na narrativa, enquanto Elisas são o produto que (ainda) se quer ver. Com isso, não se quer dizer que mulheres empoderadas não são importantes, mas que o mundo continua a todo momento tentando nos empurrar para escanteio.

Igualmente, os homens retratados também são o resultado dessa mesma sociedade: precisam ser racionais e desprovidos de sentimentos. Mas quando são enfeitiçados para que sintam amor, se transformam em “menininhas choronas” e, literalmente, morrem por não saberem lidar com isso (achei pesadíssimo quando Elisa reclama do amante usando essa expressão e, confesso, nem consegui achar engraçado na hora). Deste modo, a nossa bruxa do amor procura por esse homem culturalmente tido como ideal e rejeita todos aqueles que consegue “conquistar”, pois, assim que se tornam seres sensíveis, perdem sua característica essencial de macho alfa.

E até mesmo o dito "esquerdomacho" está retratado no filme, através do Gahan (Jared Sanford), o bruxo que usa de discursos de empoderamento feminino para tirar uma lasquinhas de suas discípulas (e até abusar sexualmente mesmo).

Mas, não se preocupe, nada disso vem mastigadinho pelo roteiro. Anna Biller tomou o cuidado de construir uma narrativa que não fosse condescendente com seu público. A edição é precisa e vai nos dando as informações suficientes para o entendimento da trama, sem cair na explanação óbvia.

Entretanto, existe uma questão importante que precisa ser ressaltada. O filme tem um objetivo claro e não há desvio de foco. Não vemos ser levantada qualquer outra questão envolvendo outras minorias e a mulher negra tampouco entra em pauta. Ainda assim, acredito que é um filme extremamente relevante dentro do que se propõe a tratar. É uma desconstrução, através do exagero dos estereótipos, de uma ideia que permanece arraigada no nosso imaginário e que precisa ser debatida.


Assim, esse filme me conquistou imediatamente. Como amante do horror, não tem como não ficar atraída pelo visual extasiante. Não tem como não se afeiçoar a quem faz aqueles closes lindos nos olhos da bruxa, me lembrando tanto do meu queridíssimo Bela Lugosi com seu olhar arrebatador. Não tem como não ser conquistada pela afetação e estranhamento que perpassa todo o longa. Não tem como não se apaixonar pelo texto feminista que acompanha tudo isso. Não tem como não idolatrar essa cineasta que imaginou e executou essa obra toda.

Mulheres que amam o terror, e aquelas que nem tanto, uni-vos para abençoar essa nova cineasta que surge, quase autossuficiente, com uma narrativa própria, para criar produtos de uma qualidade incrível e que possuem foco em NÓS! Gente, esse é só o segundo filme dela e eu estou louca para assistir Viva, seu primeiro longa. Bora exaltar Anna Biller!
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Aqui trago outros textos de mulheres lindas sobre esse filme lindo:
 
The Love Witch e a Falta de Amor (da Jéssica Reinaldo no Fright Like a Girl)