24.6.07

Medo (Janghwa, Hongryeon)

Título internacional: A Tale of Two Sisters

Como se posando para um retrato: Duas meninas sentadas em uma namoradeira de madeira e tecido decorado no estofado, usam camisola branca ensanguentada. A menina da esquerda parece desfalecida e a da direita senta ereta olhando séria para a frente. Atrás de cada uma delas estão um homem grisalho (à esquerda) que apoia uma das mãos no encosto do sofá e olha para frente sério, e uma mulher (á direita) que sorrindo apoia as mãos nos ombros da menina à sua frente.






2003
Terror/Drama
Direção: Ji-Woon Kim
Roteiro: Ji-Woon Kim






A Tale of Two Sisters é um filme baseado em um conto coreano a respeito de duas irmãs: Janghwa (“Rosa”) e Hongryeon (“Lótus Vermelha”). Assim, apesar de contar uma outra história, Ji-Woon Kim mantém o nome do conto a fim de que o público coreano já tenha em mente pelo que esperar. Estratégia inteligente adotada no título original e medíocre no nosso nacional. Por isso, me recuso a usar o título Medo aqui.

Depois de passarem uma temporada fora, as irmãs Soo-Mi (Su-Yeong Lim) e Soo-Yeon (Geun-Yeong Mun) voltam para casa e para a convivência com seu pai Moo-Hyeon (Kap-Su Kim) e a madastra Eun-Joo (Jung-Ah Yum). Logo, a madrasta transforma o regresso ao lar em um pesadelo.

Esse é um filme sublime. Belíssimo em termos de fotografia, cenário e trilha sonora. Na verdade, não sei o que me encantou mais. Parece que estamos assistindo a uma poesia visual e auditiva. A música suave que acompanha o filme é deliciosa e delicada, contrapondo com o drama que se desenvolve. O cenário inteiro se resume em uma casa e suas imediações campestres. As cores usadas do chão às paredes, os desenhos das cortinas e papéis de parede, tudo parece ter sido meticulosamente pensado para deixar o filme ainda mais pesado (e em alguns momentos mais leve). Simplesmente perfeito.

O roteiro é um item à parte. Complexo, denso e paradoxalmente suave, quase lento demais. À medida que se desenrola, ao invés de esclarecer, vai-nos deixando cada vez mais confusos e requer algumas (várias, diversas) horas de tutanos cozidos para conseguir encaixar tudo em seus lugares. E ainda não sei se o fiz por completo.

Com indícios do que virá pelo final, o filme vai se desenrolando num clima de disputa familiar entre Soo-Mi e a madrasta Eun-Joo (pela atenção do pai Moo-Hyeon e pela proteção de Soo-Yeon), e entre Soo-Mi e Moo-Hyeon (numa incansável cobrança pela presença e atitude deste último). Ficou confuso? Bom, em resumo, é a família mais desajustada que eu já vi. A única coisa harmoniosa que existe nela é a relação entre Soo-Mi e Soo-Yeon.

Nesse clima tenso, em que o pai está na maior parte do tempo ausente, a madrasta começa uma sessão de tortura psicológica (e no final física) contra as duas irmãs. Eun-Joo durante o filme todo se comporta como uma louca, com longos momentos de uma histeria patética em que seu marido a olha com desprezo e logo depois lhe entucha dois comprimidos para que ela não fique “doente” novamente.

Enquanto isso, Moo-Hyeon NUNCA se dirige à filha mais nova, inclusive não olha diretamente para Soo-Yeon nenhuma vez. Além disso, ele parece não se importar com o modo como sua esposa trata suas filhas, e se porta como se nada estivesse acontecendo. Apenas algumas vezes ele olhou com uma certa pena (misturado com um pouco de desprezo e vergonha, talvez) hora para Soo-Mi, hora para Eun-Joo; e em outras ocasiões ele pediu para que elas (separadamente) parassem de dizer disparates. No restante do tempo, ele parece fingir sequer estar lá.

SPOILER:

Esses são os maiores indícios do que realmente está acontecendo. Pois na verdade, Soo-Mi e seu pai são os únicos moradores daquela casa. Soo-Mi tem dupla personalidade e acredita ser sua madrasta (que de fato aparece na casa somente no final do filme). E Soo-Yeon... está morta.

Apenas no final do filme é que as coisas começam a ser desvendadas. Oras, é por isso que o pai não ligava para os mau-tratos, é por isso que ele olhava para Soo-Mi e Eun-Joo da mesma maneira, é por isso que ele não falava com Soo-Yeon. Mas, como Soo-Yeon morreu? E quem era a mulher que veio visitar Soo-Mi durante a noite (numa das cenas mais assustadoras do filme)? A resposta veio fragmentada, em meio às lembranças de Soo-Mi e Eun-Joo.

Eun-Joo era a outra, ela havia tirado Moo-Hyeon da mãe das meninas. Sem poder suportar, num dia em que seu marido aparece na casa com Eun-Joo, a mãe resolver dar fim à sua própria vida se enforcando dentro do armário de Soo-Yeon. A pobre menina, desconhecendo o fato, abre seu armário pela manhã e se depara com o corpo da mãe. Num rompante de desespero ela tenta tirar a mulher, derrubando o armário sobre si. Eun-Joo é a única que vê a menina altamente machucada e presa sob o armário, mas nada faz. Essa omissão custa a vida de Soo-Yeon.

E aquela mulher que veio ao quarto de Soo-Mi era sua mãe morta, que agora quer se vingar da rival Eun-Joo e, diga-se de passagem, no final parece que consegue.

As atuações são perfeitas. As duas meninas têm a força e a delicadeza (respectivamente) que a história pede. A madrasta passa por tantos momentos que é quase impossível acreditar que era a mesma personagem, e Jung-Ah consegue diferenciar cada nuance e ainda assim mantê-la a mesma. Do pai poderia-se pensar que seu papel é até fácil de fazer, mas como demonstrar preocupação e ausência ao mesmo tempo? Kap-Su faz isso.

Mas e o terror? Tem quem diga que esse filme é puramente drama, mas eu acho essa afirmação tendenciosa e inverossímil. O que prejudicou o filme foi o marketing errado (o trailer chega a ser ridículo). Com grandes doses de drama, o público pode se sentir enganado sim, mas o terror está lá. E apesar de proporcionalmente serem poucas, existem cenas em que eu estava pronta para arrancar o braço do sofá se a minha cama fosse um sofá com braços (e eu queria que fosse, para eu poder arrancá-los).

A Tale of Two Sisters chegou para se fixar como um dos meus filmes prediletos. E deixe o gênero para lá, pois não falo somente dentre os filmes de terror.


4 comentários:

Marcus Vinícius disse...

Um grande filme, concordo contigo que tecnicamente ele é impecável. O cinema asiático, na minha opinão, junto com o argentino, são os que mais crescem na atualidade, as safras estão ótimas. Ah, e pra variar Hollywood já vão fazer o remake de "A tale of two sisters" também.
Gostei desse blog, não sou tão fã assim de terror, mas agora tenho um lugar a mais pra buscar ótimas dicas sobre o gênero.
Bjs e até mais.

Daanii disse...

O filme é extremamente ruim. Não me convenceu nem no drama nem no terror. Filme nesse estilo prefiro Boa noite, mamãe

tha disse...

Oi, Daanii, opiniões adversas fazem parte do mundo.

A Tale of Two Sisters é um dos filmes que eu mais gosto da vida, sendo sua complexidade, atuações e beleza formal as características que mais me atraem nele.

Gosto também de Boa Noite, Mamãe, mas nem de perto tanto quanto de A Tale of Two Sisters.

Abraço!

tha disse...


(Infelizmente, Marcus Vinicius não foi respondido porque eu fiquei alguns anos longe do blog, mas se algum dia reaparecer, saiba que agradeço sua visita e comentário - Aliás, aproveito para dizer que a refilmagem de A Tale of Two Sisters é bem fraquinho.)