9.1.11

Death Proof (À Prova de Morte)

2007
Ação, Terror
Direção: Quentin Tarantino
Roteiro:
Quentin Tarantino


Tive a oportunidade de assistir a versão que saiu em DVD. E esse filme vale um novo texto! Porém, dessa vez não pouparei spoilers; portanto, quem não o tiver assistido e não quiser estragar a surpresa do filme, sugiro que interrompa essa leitura e veja sobre À Prova de Morte somente na resenha que fiz do projeto original, Grindhouse.

Stuntman Mike (Kurt Russel) é um ex-dublê de antigos filmes de ação . Depois de ver sua carreira finda, ele encontra um bom passatempo: perseguir garotas em seu carro 'à prova de morte'.

Os defeitos visuais, a trilha-sonora, a homenagem aos filmes B como um todo é de se tirar o chapéu, mas disso tudo já falei bastante quando escrevi sobre Grindhouse. Agora minha abordagem é outra.

Quentin Tarantino é um cara excepcional. Como fazer um filme de ação e terror, onde mais da metade dele é puro diálogo, sem ser enfadonho? Ele consegue. Nessa segunda vista, prestei mais atenção às falas e percebi como elas vão se emendando e se tornando interessantes po si só. E o engraçado é que a versão para DVD tem muito mais diálogos do que a versão original. Ainda assim, não me cansei de acompanhar aquela conversa fiada, à primeira vista gratuita.

Mas não há nada de gratuito em À Prova de Morte. Absolutamente nada. Cada frase pronunciada tem o seu propósito. Na primeira parte, o diálogo nos conduz ao seu momento chave, a dança - que sequer aparece na versão original, mas que tem grande importância na construção das personagens. E nos apresenta a quatro moças diametralmente opostas às que irão surgir na segunda parte. Moças que irão morrer, violentamente, mas que ficarão vivas no imaginário do espectador assombrando boa parte da segunda metade do filme.

E é nessa segunda parte, a qual se inicia com diálogos semelhantes aos das primeiras jovens, que temos a impressão errada de que dali em diante tudo será como foi anteriormente. Porém, aos poucos a conversa vai tomando uma direção diferente, dessa vez já antecipando o final que nunca poderíamos esperar. As falas apresentam a diferença crucial entre os dois grupos de garotas e também nos destrincha as qualidades de Zoe - que serão de extrema importância para explicar o desenrolar da trama. É tudo construído com maestria, palavra por palavra. E quando as meninas viram o jogo e perseguem Mike em busca de vingança, o filme se torna êxtase puro. Tarantino cria uma imagem e a desconstrói de maneira perfeita.

Aliás, os dois desfechos que Tarantino cria para ambas as partes são apoteóticos. O primeiro, em que Mike bate com seu carro de frente com o carro das jovens é excepcional. Repetido várias vezes para melhor apreciação. E, com isso, cria-se uma apreensão que dura um bom tempo. Essa cena, somada ao início dos diálogos entre as novas vítimas de Mike - que, como eu disse, remete aos diálogos iniciais do filme -, são o suficiente para que o espectador fique esperando que uma morte pelo menos tão chocante as espere no desfecho final. E é um deleite ver que o jogo vira completamente, que Mike de caçador vira caça. Que ele sofre, apanha, chora. É delicioso. E o momento final, em que as garotas o fazem de joão-bobo é o chantili do bolo. Porque a cereja é a pisada que ele leva após o início dos créditos.

É também nessa mudança de rumos que À Prova de Morte se distancia dos filmes que quer homenagear e coloca-se como um filme contemporâneo. Quando um filme da década de 70 apresentou um grupo de mulheres a exemplo de Zoe, Abby e Kim? De sexo frágil, a jovens passaram a resolver seus próprios problemas sozinhas. Nada de chamar a polícia, gritar por socorro, abraçar um homem viril que as defenderão de todo o mal. Assim, Tarantino homenageia sem cair na repetição e trazendo sua marca pessoal e atual.

E Kurt Russel, em sua melhor forma, é tudo o que Tarantido precisava. Ele é simpático, assustador, nojento, sádico, babaca e patético. Tudo na mesma proporção. Cada faceta do personagem sobrepondo a outra, cena atrás de cena, sem deixar de ser o mesmo todo o tempo. Inclusive, finalmente alguém leva um tiro e chora de dor em um filme!

Enfim, não posso imaginar À Prova de Morte como um filme menor de Tarantino. É, talvez, mais despretensioso, com ares de trash e filme B, mas não menos genial do que seus melhores filmes.

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