
1986
Suspense
Direção: David Lynch
Roteiro: David Lynch
Vamos ser sinceros. Eu não tenho nenhuma pretensão de dissertar profundamente a respeito de Veludo Azul e David Lynch. Mas vou dar uma pincelada nas minhas impressões gerais, lembrando até do que já li de um e de outro.
Em uma pacata cidadezinha americana, o pai de Jeffrey Beaumont sofre um enfarte, o que traz o rapaz de volta à cidade. Porém, voltando do hospital, Jeffrey (Kyle MacLachlan) encontra uma orelha humana em uma área não habitada da cidade e vai comunicar o Detetive Williams (George Dickerson). Impulsionado pelo seu gosto por mistérios, Jeffrey descobre com a filha do detetive, Sandy (Laura Dern), algumas informações que poderiam ajudá-lo a desvendar o estranho caso. Seguindo uma pista, o jovem se envolve com a misteriosa cantora Dorothy Vallens (Isabella Rossellini) e com o violento e prigoso Frank Booth (Dennis Hopper).
Bom, vamos por partes. Eu não sou expert em cinema, esse blog é um grande hobby meu, e mesmo eu tendo pesquisado um pouco, com certeza deixarei coisas faltando ao analisar o filme. David Lynch já havia feito outros filmes, como Eraserhead (1977) e O Homem-Helefante (1980), e já era um diretor conceituado quando fez Veludo Azul. Não conheço muito o cinema dos anos 80, mas ao que eu saiba, pouco se fazia de diferente do "normal" naquela época. Claro, existia Kubrick já desde muito antes, mas o cinema tradicional de Hollywood era ainda a maioria quase absoluta, com algumas exceções de filmes europeus (normalmente aquele tipão paraaaado) que se destacavam aqui e ali.
Veludo Azul é o meu segundo filme de David Lynch. Já havia assitido Cidade dos Sonhos (2001) há um bom tempo atrás e já não tinha entendido nada. Inclusive eu ainda estava iniciando a minha incursao no mundo do cinema, de modo que precisarei revê-lo. Porém, ao assistir Veludo Azul, achei que este não é tão complexo em termos de roteiro, mas tão ou mais estranho quanto o outro. Agora, fico pensando que se eu, que até já estou acostumada com a variedade atual de filmes diferentes, tive uma certa dificuldade em captar as nuances de Veludo Azul, imagino a ruptura que deve ter sido na cabeça daqueles que o assistiram em 1986.
O início do filme, acredito eu, é a parte mais chocante. Talvez pelo fato de que você acabará se acostumando com a estranheza e se deixará envolver durante o restante da película. Ainda assim, é um baque. Tanto a sequência de abertura, com as flores coloridas, as crianças brincando, o fundo musical da década de 60, todos sorrindo e tranquilos - a cidade perfeita? -, que finaliza com o enfarte de um senhor que está regando as plantas do jardim e se fecha em um close de insetos grotescos na grama verde; quanto um pouco mais à frente, quando Jeffrey conhece Dorothy e Frank em seus acessos de sadomasoquismo e loucura.
Aliás, destaque para as atuações de Isabella Rossellini e Dennis Hopper. Perfeitos. Já Kyle MacLachlan, tive dificuldades em analisar seu desempenho, pois não conseguia me distrair do enorme queixo que o rapaz possui. Sério, enorme. Eu sei que é ridículo, mas desculpe-me, sou humana. De qualquer modo, não creio que isso teria acontecido comigo caso ele fosse um excelente ator.
Voltando à sequencia inicial do filme, eu acredito que de certa forma ela mostra que aquela cidade pacata, que parece tão perfeita e inofensiva, esconde horrores que não se vê na "superfície". Por isso o close nos insetos grotescos. Também pode ser vista como uma crítica, já que a suposta perfeição da cidade é mostrada de forma tão caricata e exagerada que tudo parece ser ridículo e artificial.
O roteiro não traz tudo de mão beijada. A gente tem que ir deduzindo a história conforme ela se desenrola, e em alguns momentos a sugestão é só o que nos é fornecido. David Lynch não está interessado em explicar, apenas em mostrar o que ele julga ser mais importante (também plasticamente?). Assim, se como roteiro Veludo Azul é ousado, como direção e fotografia é ainda mais. Figurinos e cenários fazem um mix desconcertante de cenas bizarras. O apartamento de Ben (Dean Stockwell), integrante do submundo de Frank, com as mulheres gordas à mesa, com o grande palhaço sentado no sofá, dá margem a momentos de uma estranhesa completa.
No entanto, me parece que toda essa estranhesa serve para desnudar o que a sociedade realmente é e tenta desesperadamente mascarar. O que me lembra, de certa forma, O Cheiro do Ralo, que nos aproxima dos personagens através do lado mais podre que poderia haver em nós. Seja parte da violência e sadomasoquismo de Frank; da loucura de Dorothy; ou da curiosidade exacerbada de Jeffrey, que o leva a esse submundo de horror.